22.7.11

Shampoo



Andava pensando muito no egoísmo alheio e na falta de tato. A mão, já macia por causa da água quente e sabonete, fazia seu percurso por limpar o corpo.
Review do dia, alguém tinha sido pouco cortês; mas assim são as pessoas e não se pode decepcionar com obviedades. Nada de sentimentalismos.
Os olhos voltaram para a altura da basculante, vidro de shampoo, "contém extrato de alho", ótimo, talvez eu me livre desses vampiros.
Egoísmo, rudeza...um pouco de raiva emanava de seu corpo e se misturava com os vapores do banho. Nada como um banho quente para se esfriar a cabeça.
Mais um minuto ali e já podia sentir a pele esticada, como se o corpo fosse inflar e se romper. Mas isso era ridículo e deixou essa visão de lado. Jamais: estamos cá presos, envoltos por uma casca. Ilhas.
Desligou o chuveiro e perdeu-se no vapor, de olhos fechados. Era difícil respirar, e quando tentava um fôlego novo, o vapor entrava por sua garganta, fazendo tossir. Por vezes também se perdia em bobagens. Quantas pessoas terminaram o banho nesse instante? Quanto de água foi ralo abaixo? Se todas as pessoas pensam que as pessoas são egoístas, quem está contra nós? ... Ilhas móveis.
Lembrou-se novamente do episódio e engoliu em seco. Amargo. Há um sequência para o que sentiu em resposta: humilhação, tontura aspereza. A toalha áspera secava o corpo e de novo, a sensação de que a pele ia se romper e, tudo o que estava contido ia se espalhar ao universo num panteísmo divino.
Não seja idiota, idealismo tem limites.
Enrolou-se na toalha e abriu a porta do banheiro para sair no ar gélido e desconfortável da realidade. Sem escudos, apenas uma toalha.