tag:blogger.com,1999:blog-185752692024-02-28T03:00:35.879-03:00despautère.s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.comBlogger60125tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-5516624786639373242014-09-14T23:53:00.000-03:002014-09-14T23:54:37.696-03:00Sobre São Paulo II<div style="text-align: justify;">
Quem vive em São Paulo e, se por acaso quiser escrever como é tal experiência, que coloque como título "diário de bordo".</div>
<div style="text-align: justify;">
Cheguei a mil conclusões sobre São Paulo nesses três meses à bordo. Todas são conclusões mutáveis mas, a mais interessante é a do conceito de navio, mar. Essas coisas.</div>
<div style="text-align: justify;">
Morar em São Paulo à trabalho sempre será como ter um oceano a ser explorado. Vasto demais pra desbravar, com tempo livre de menos. Como passar por uma vitrine de doces todos os dias, salivar, e só. Ou melhor: como ver a ilha do tesouro logo à frente e perceber que é uma miragem. </div>
<div style="text-align: justify;">
O trânsito de São Paulo é fantástico. Fabuloso, no sentido de fábula mesmo. A rua congestionada que vi ontem, em determinado horário, não estará congestionada amanhã. Os motoristas, com toda a destreza que nunca entenderei, acham canais e rotas alternativas mágicas. A imprevisibilidade do trânsito de São Paulo me lembra um pequeno trauma de infância; um que obtive ao ser derrubada por uma onda, quando menininha. O interessante é: sempre haverá ondas. Não importando a intensidade delas.</div>
<div style="text-align: justify;">
Peguei tempo frio aqui. Inverno. Acostumada que estava a sempre sentir calor nas cidades que morei, me senti acolhida pelas massas de ar polar que aqui estacionaram. E todas as pessoas usam casacos compridos e pretos. Então você atravessa a pista de quatro faixas contra um fluxo de pessoas muito agasalhadas às 7 da manhã, mesclando com o tempo cinza e fuligem. Achei isso extremamente paulistano. Não importa quão ruim está o tempo, o barco tem que continuar sua viagem. Mesmo que isso signifique ficar sem água e respirando um ar muito poluído, que deixa seus olhos ardendo e sua garganta arranhando. Carry on!</div>
<div style="text-align: justify;">
Dos fatos curiosos sobre a capital, essa do "tempo louco" eu sempre soube, mas não tinha noção prática. Quando o inverno foi se descaracterizando lá pelo meio de Agosto, diversas estações passaram por aqui, confundindo os sentidos e o sistema imunológico de muitos, aos quais me incluo. E, devo admitir, que as pessoas de São Paulo, antes vestidas elegantemente de preto no frio do inverno, ao sol, em plena luz radiante do sol, parecem um pouco encardidas. Digo, a aparência das tribos daqui, que são várias, são mil, para que se mantenham, não parecem reluzentes quando o sol brilha. É só entrar no metrô num horário de passeio e constatar as calças sob vestidos, cabelos verdolengos, batons vermelhos demais, aros grossos demais, alargadores largos demais, coisas encardidas, enfim. Calateboca. É que tenho essa outra teoria de que ninguém mais quer ser normal em São Paulo. Pra quê o turbante, moça!? Me sinto mal usando roupas sem estampa, mas logo passa. Foi uma náusea, náusea por conta dos balanços desse barco.</div>
<div style="text-align: justify;">
Reitero o que disse no primeiro "Sobre São Paulo": todos aqui são forasteiros. Forasteiros que entraram de gaiato e que lutarão bravamente para não andar sobre pranchas. Daí chegamos a conclusão definitiva que São Paulo é um navio pirata.</div>
<div style="text-align: justify;">
Ouço murmurinhos em todas as esquinas, em todas as lojas que entro, em todas as estações: sou do interior, sou do interior. Como que, sendo de dentro, passamos pro lado de fora, ao céu aberto, à deriva.</div>
<div style="text-align: justify;">
Da luta levada bravamente, vem outra constatação dos piratas daqui. São Paulo vai endurecendo os corações, vai calejando teu dia a dia, vai acostumando seus olhos para os tons de cinza. Como diz o paulistano Lourenço Mutarelli, a vida é dura. Tão mais dura e angulosa é em São Paulo.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
***</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
(continua)</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<br />
<br />s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-28474058106289027962014-04-13T23:23:00.000-03:002014-04-13T23:23:00.465-03:00Mundo velhoO casal de tios chegou à casa, por volta da hora do almoço, sem avisar da visita. Chegaram com roupas um pouco puídas, como quem não queria chamar a atenção. Foram descarregando o carro, algumas vasilhas grandes repletas de comida, que o tio empilhou antes de entrarem à casa.<br />
Os anfitriões velhos de guerra os receberam acaloradamente como uma solução ao domingo que, chegado a sua metade, podia tornar-se um pouco melhor e menos tedioso. "Entrem, entrem!" com surpresa e entonação animadas de muitos anos de visitas e recepções.<br />
Ao que todos da casa haviam sido pegos de surpresa, não havia mesa posta nem nada pronto para o almoço que, em domingos corriqueiros como aquele, era servido tardiamente; como tardios, lânguidos e arrastados iam todos os domingos ao seu fim.<br />
Que coincidência, aquela. Haviam perdido viagem, foram visitar a filha e, descobriram depois da longa fila dominical, que esta estava de "castigo" e que não poderia receber visitas. Então toda aquela macarronada não seria em vão.<br />
A anfitriã tratou logo de preparar a mesa, consentida a partilha do almoço a fim de evitar desperdícios. Que coincidência.<br />
Era suco? Refrigerante? O que era aquele líquido âmbar dentro da garrafa pet? Então explicaram que as garrafas de plástico só entravam sem rótulos. Alimentos, somente em duas embalagens transparentes de plástico. Balas, apenas desenroladas do invólucro de papel, papel higiênico, sem o cilindro central de papelão. À prova de.<br />
Os pontos dolorosos daquela visita que falhara eram tratados de forma casual; a tia espantava com a mão, como quem espalhava o assunto para fora da mesa, quão sujo era.<br />
O almoço transcorreu suavemente a partir dali, entre conversa sobre bispos e paróquias e notícias sobre familiares. Então todos, satisfeitos e separados por gêneros, partiram para conversas mais íntimas enquanto digeriam o dia e o almoço.<br />
O vento da tarde assoprava o tédio denso para dentro da casa e, por volta de duas ou três horas depois, café fresco fora colocado sobre a mesa e mais um vasilhame fora aberto; agora, com bolo de chocolate.<br />
Em alguns lugares e, dependendo de quem estava de plantão, qualquer conteúdo das vasilhas era perfurado em busca de algo suspeito.<br />
O aroma do café invadia o ambiente e inebriava os presentes. Um calmo comentário ou outro sobre o que estava passando na tv, apesar da energia pulsante que o café lhes causava.<br />
Mas souberam da morte da fulana? Não souberam, mas receberam a notícia, ali, naquele instante, com a serenidade dos anos. Tão jovem, que pena era. Lembravam-se dela, é claro. Havia causado trabalho à mãe adotiva porque era arredia, rebelde. Morrera sem dentes, magra. Deram-lhe os sintomas como palpite da causa, mas não ousaram nomear o mal.<br />
Estava tudo suspenso no ar.<br />
Sim, lembrava-se dela, disse o anfitrião. Meninada bonita, era aquela. E rebeldes... Acabaram saindo de casa, se afastando. E a pergunta pairava no ar, que mal tinham cometido?<br />
Pausa e métrica ao falar. A nostalgia subia com os vapores do café e se misturavam ao torpor do domingo.<br />
Os hiatos, comuns àquela altura da vida, eram cheios de significado e peso.<br />
Que mal tinham cometido até aqui?<br />
<br />
<br />s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-55533128216392754942014-01-05T23:12:00.002-02:002014-01-26T00:27:27.430-02:00Consonância<p dir=ltr>Sempre quis mostrar a tristeza profunda que residia atrás de seus olhos, mas nunca tivera atenção. Então, ao invés disto, exibiu várias lâminas de felicidade. Lâminas fatiadas e finas, superficiais. Uns fragmentos que, se juntássemos, não compunham um quebra-cabeças completo.<br>
Sabia que sempre lhe faltaria essa peça. Ou melhor, sempre sobraria aquela outra.<br>
Vários sorrisos, mas nenhum olhar mais profundo. Muitas frases feitas e silêncios entre elas.<br>
Tudo transcorria com tranquilidade no mundo dos serenos. Mas ninguém iria dormir um sono com sonhos tranquilos aquela noite. Nem na próxima. Um som de apito para cães, aquela vibração dentro da caixa torácica, quando o silêncio é tão esmagador. E a solidão tão cortante. <br>
E a felicidade estava em cacos. Pedacinhos pequenos que teimavam em juntar, mesmo que isso não tivesse significado lógico: juntava-se um lado, o outro se desfazia. Nunca satisfeitos. <br>
E a vida passava o tempo tentando casar o que não precisava, de olhos fechados, desatenta.</p>
s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-48033329419680117682013-11-24T23:03:00.002-02:002013-11-24T23:03:44.371-02:00Sonho IIIVera. Por que se submete a esse tipo de tratamento? Você deve se impor.<br />
O olhar de Vera era de medo, de sofrimento, sobretudo. Um sofrimento causado por extrema covardia e falta de pulso firme. Com olhos trêmulos, Vera balançava a cabeça negando, dizendo "não" para qualquer ação que a tirasse daquela situação. Que a tirasse daquela perseguição.<br />
Algo sobre uma figura masculina opressora, predadora. Oprimia Vera, esmagava Vera contra o solo.<br />
E Vera tinha mãos e olhos trêmulos, impotentes.<br />
Eu negava com a cabeça, com palavras absurdas. Faça algo, Vera! Você não pode se submeter a isso!<br />
E não era possível. Se ele notasse alguma reação, se ele notasse alguma rebeldia, a represália seria imediata.<br />
Faça! Grite! Mude!<br />
Vera nega, e sugere que eu me acalme. Pegue seu café no fogão, se acalme.<br />
Eu vou até a cozinha e em movimentos lentos de câmera noto o gás escapando.<br />
E ao mesmo tempo que a explosão ocorre, sei que fora <i>ele</i>.<br />
Cor negra e som agudo final aos ouvidos.<br />
Eu não posso morrer assim, repeti diversas vezes dentro de minha caixa craniana. Em desespero, no início. E logo com certo alívio e curiosidade por ainda haver consciência. A escuridão e som agudo continuaram até que eu despertasse às 6 da manhã.s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-60874579701234058792013-07-16T20:53:00.000-03:002013-07-16T21:01:27.974-03:00Morte em linha reta<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Sempre que precisava andar com a mulher grávida na
rua, para algum compromisso a que era convocado, Adão parecia andar como quem
tinha duas pernas esquerdas.<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Desde que ela
engravidara, desde a noite fatídica em que ela dera a notícia de sua gravidez,
Adão sentia-se embriagado e fora de si. À parte. Aquela vida não era a dele e,
por isso, seria um expectador, olhando do alto. Enquanto isso fazia tudo com
desastre, sem prestar atenção. Sua mulher o guiava. Benzinho, você esqueceu a
mala de emergência no carro, coisas do tipo.<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Assim se passaram os
meses, os torturantes meses da gravidez. Tudo era um grande evento em que Adão
se sentia um pino deslocado. Havia firulas, chás, compras sem fim, listas e
mais listas de nomes para o bebê. Adão opinava em vão.<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Essa seria a consulta
para que marcassem o parto. Nascimento programado. Ela estivera a semana toda
empolgada com as datas em que<span class="apple-converted-space"><i> </i></span><i>possivelmente<span class="apple-converted-space"> </span></i><span class="apple-converted-space">se<i> </i></span>completariam as
semanas de amadurecimento do bebê. Algo sobre signos, horóscopo. Adão se
tornava cada vez mais ansioso, não sabia a razão. Era involuntário.<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">O médico, atencioso,
disse que dali duas semanas o bebê podia nascer de cesariana. Era mais seguro. Assim,
os pulmões estariam já maduros, no que Adão pensou em duas pêras pneumáticas,
amarelinhas e suculentas. E o bebê engordaria. A imaginação de Adão ia longe.<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Porém, disse o médico
por fim, porém o bebê pode vir naturalmente, mãe. O médico não discursava ao
pai. Era sempre mãe, mãe, mãe.<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">O bebê poder vir
naturalmente assim que se completarem as semanas.<span class="apple-converted-space"> </span><i>A qualquer momento</i>. Quando você
sentir um líquido “estranho”, dores, contrações... mas a atenção de Adão se
fora assim que o médico proclamou a sentença. A qualquer momento, naturalmente.<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Ora, a Natureza não
tem tempo, Adão, disse pra si. Isso não faz sentido, não faz! Os neurônios dele
fritavam feito shimeji na manteiga. <o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">O médico se referia a
ele agora - pai, fique atento aos sinais. O médico fechou os olhos poucos
milímetros, mas Adão tinha boa visão, ah, se tinha. Notou a ameaça velada,
fique atento aos sinais e, em qualquer sinal de trabalho de parto, corra pro
hospital. A qualquer momento, pai, a qualquer momento assim que se completarem
as semanas.<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Aquilo não fazia o
menor sentido. A imaginação de Adão ia longe. Iremos sentar, comer, tomar
banho, cortar as unhas, dormir e esperar. Ficar atentos com o tempo natural da
Natureza. Então o nascimento, que não tem segredo nenhum, veja você, até agora,
é feito uma morte ao contrário. Riu. Otário. Claro - claro – que o nascimento é
a morte ao contrário.<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Vou ficar preparado
como um corredor fica inclinado na largada, pensou. <o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Seu cérebro deu um estalo. Não, fora só um insight
medonho. Mas pensou ter ouvido o estalo. Então é assim, vida? Sim. Estou
esperando a morte ao contrário do meu filho enquanto a minha própria – morte em
linha reta, no caso – eu não sei quando vem. Mas vem. É natural, no tempo
bizarro de ponteiros loucos da Natureza. E agora, e agora?<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Levantou-se. O médico, que ainda discursava para a
gestante, parou para fitá-lo. Sua mulher virou para olhá-lo com um rosto
interrogativo. <o:p></o:p></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="line-height: 115%;"><span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Doutor,
gostaria de marcar meu parto ao contrário. </span><span style="font-size: medium;"><o:p></o:p></span></span></div>
s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-81521714159073207862013-07-09T22:23:00.000-03:002013-07-10T11:45:39.256-03:00Uma lembrança, antes que me esqueça dela de novo.<span style="font-family: Verdana, sans-serif;">Não lembro quando, minha sobrinha iria dormir em casa. Então minha irmã, mãe dela, me pediu pra comprar um pacote de fraldas porque, mesmo ela tendo saído delas, durante a noite tinha usar por precaução.</span><br />
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;">Fomos de carro, meu irmão e eu, ao supermercado. </span><br />
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;">Peguei o pacote de fraldas caríssimo e nos dirigimos ao caixa.</span><br />
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;">Uma fila gigantesca.</span><br />
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;">Meu irmão não cultiva muito o silêncio. Ele é como a grande esmagadora parte da população que gosta de papear, puxar assunto e não deixar espaços silenciosos. Sim, tendencio ao silêncio: é um bom exercício. E estava de mau humor. Mas ele, vez ou outra, consegue dissipar o mau humor das pessoas. Afrouxei.</span><br />
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;">A senhora que estava a nossa frente na fila escutava nossa conversa. Só falávamos bobagens então não tinha importância alguma.</span><br />
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;">Não lembro qual parte do diálogo fez com que a dona se voltasse pra gente pra rir. Daí começamos a conversar descompromissadamente. Falávamos sobre dietas.</span><br />
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;">Ela disse que sempre que ia à nutricionista e esta te indicava uma dieta, ela sempre acabava engordando.</span><br />
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;">"Sigo minha própria dieta, sabe. Quando faço por conta, emagreço. Aí, e médica passa aquela lista de comidas pra comer - tudo bem caro, por sinal (pra ser saudável tem que pagar caro em coisas light e diet) - e seguia à risca, tudo certinho. E não é que engordava? Desisti. Tá vendo isso aqui? Tô levando esse monte de carne é pro churrasco de dia das mães. Mas é pro marido, pra criançada. Não como nada disso não, muito pouco. O problema é colesterol. Problema do coração, pressão alta - sofro de pressão alta. E tem diabetes na família também. A gente se preocupa com tudo isso. Mas e o tempo pra ir fazer caminhada de manhã? E essa da dieta também, como é que faz certo?".</span><br />
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;">Quando estávamos indo pro carro, esperava algum comentário debochado do meu irmão. Ele só disse: Viu, somos todos muito parecidos mesmo.</span><br />
<br />
<br />s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-67603627047776822312013-06-05T18:23:00.002-03:002013-06-06T12:46:56.250-03:00Sobre São Paulo<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
Há um banheiro numa galeria na Liberdade. Fica no subsolo, em
frente ao cara que faz peeling e acupuntura. É um dos banheiros mais limpinhos.<o:p></o:p></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt;">
Já fiz várias incursões pela cidade de São
Paulo. A última vez, me perdi um pouco dentro da Estação da Sé. Ando boiando
ouvindo alguma música e, às vezes, sigo o fluxo e acabo na direção errada. Mas
quando me perco não fico preocupada, confio demais em placas e coisas do tipo.
Acabo encontrando a direção. Etc.<o:p></o:p></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt;">
Assim, quando vou a São Paulo, ando
demasiadamente. <o:p></o:p></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt;">
Tive que voltar da Cidade Universitária,
uma vez, sem ao menos saber que ônibus devia tomar. Lembro que estava frio e,
zanzando perto da Estação Anhangabaú, pensei se conseguiria enganar os
transeuntes ou se na minha cara estava estampado “forasteira”. Bobagem: todos
que zanzam por São Paulo são forasteiros. <o:p></o:p></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
Outra vez, fui assistir a uma peça com um amigo. Ele me fez andar
quase a Consolação inteira e garoava. Mais tarde, passei o resto do dia na Livraria Cultura (um dia muito gelado,
por sinal). <o:p></o:p>Repetidas vezes andei a linha azul inteira pra chegar ao Terminal do Jabaquara.</div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
Perambulei pela Vila Madalena, em 2010, buscando um lugar pra
almoçar. Sozinha, num congresso. Ao que um grupo de estudantes do mesmo
congresso me chamou pra almoçar. Então todos, perdidos e estranhos, procuraram
um restaurante naquele bairro metido à besta. Encontramos um vegetariano
estranhíssimo.<o:p></o:p></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
Tomei vários cafezinhos numa padaria muito suspeita na Virada
Cultural, perto da 25 de Março. Marquei de encontrar com um amigo lá e, quando
chegou, perguntou que diabos eu fazia num pardieiro daqueles. <o:p></o:p></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhZFLA8MWRPYoovhCx9a9Vw_PHmv3iz1tmWijRaF0foP0sbbkplWXzGysueAdT87qh5ffgQNWHf7YnCbd5E8EBHliNNSQaJshqAyRgblM46wA5x0pxkcuPi-JIV8inmcIJ7zGuJsA/s1600/escolaquefiquei.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="226" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhZFLA8MWRPYoovhCx9a9Vw_PHmv3iz1tmWijRaF0foP0sbbkplWXzGysueAdT87qh5ffgQNWHf7YnCbd5E8EBHliNNSQaJshqAyRgblM46wA5x0pxkcuPi-JIV8inmcIJ7zGuJsA/s400/escolaquefiquei.jpg" width="400" /></a></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
Já andei pela linha amarela só pra ver como era bonita. Fui ao
Museu do Ipiranga só olhar aquele jardim. Fui ao Museu da Língua Portuguesa, ao
MASP. Ao zoológico. Comer pão com mortadela no Mercado. Por curiosidade mórbida
já peguei metrô na Estação Corinthians-Itaquera de manhãzinha (e não é nem um
pouco agradável). Já andei pela Vila Formosa. Aliás, já andei do Tatuapé até a
Vila Formosa. A pé.<o:p></o:p></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
Minha memória tende a falhar e não sei quantas vezes andei por São
Paulo, e gosto muito de lá (daí, se aí você se encontra). E, claro, quando
converso com um paulistano ou alguém que mora em São Paulo, dizem que meu gosto
pela cidade é puramente coisa de turista.<o:p></o:p></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
Pode até ser. Se eu morar um dia em São Paulo ficarei tão
entediadamente ocupada com algum emprego e não verei o metrô do mesmo jeito.
Nem as ruas, nem as pessoas desconfiadas e simpaticamente mal-educadas. Talvez
eu até encarne a cara de zumbi das pessoas do trem.<o:p></o:p></div>
<br />
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
Mas é uma bela cidade para a solitude e incursões sem propósito. De
qualquer forma, há um banheiro limpo e confiável na Liberdade, subsolo de uma
galeria de quinquilharias, pode confiar.<span style="font-size: medium;"><o:p></o:p></span></div>
s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-64871481570766335332013-04-28T16:29:00.004-03:002013-04-28T16:29:34.534-03:00Cigarros imaginários<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Sinaliza uma circunferência com o
dedo indicador.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">- Mas eu sei de uma melhor - “Eu”
com ênfase demasiada – ou pior, como quiserem. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Ajeitou-se na cadeira na postura
de um cúmplice.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">- Minha prima – pausa para olhar
para a cara de todos. Dentre desinteressados e acenos com a cabeça, continuou –
vocês não a conhecem, ela não mora na cidade. Não sei como ela suporta essa
vida, coitada. Ela arranjou esse namorado há um ano e meio, eles se conheceram em
um espaço para fumantes numa balada, não lembro qual.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">O garçom voltava com a outra
cerveja que ela pedira.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">- Obrigada. Pois bem, marcaram de
ser encontrar mais uma vez. E outra... E outra. E então meio que já estavam
namorando. Ela foi um pouco tola, claro. Quando percebeu, já estavam muito
grudados, interferindo em tudo na vida um do outro. Ele era muito ciumento.
Muito. Quase perdeu todos os amigos, porque foi se afastando, recusando
convites... Enfim.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Quis terminar com tudo aquilo há
uns oito meses atrás, ela estava realmente sobrecarregada, sem vida social
nenhuma – bebericou a cerveja e seus dedos ficaram gelados por causa do copo –
E claro, ele chorou, se recusou em perdê-la. Duvidou da fidelidade dela e a
ameaçou. Ela não levou aquilo à sério, ela não estava o traindo. Só estava
querendo respirar de novo. Ele disse que ela não arranjaria mais ninguém, que
não ficaria com mais ninguém, etc, etc. Ela não tomou nada daquilo como
verdade. Ele estava nervoso, tudo melhoraria com o tempo. Estavam fazendo mal
um ao outro.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Passou-se um mês, e não se
falaram nesse tempo. Mas às vezes o telefone dela tocava às 2 da manhã e ficava
mudo do outro lado – riu um riso nervoso – marcou um cinema com um amigo uma
vez, e mais uma vez seu telefone tocou numa madrugada qualquer. Ele disse que
estava vigiando, que ela tomasse cuidado. Não sei em que dimensão que isso
ficou, mas ela resolveu se mudar daqui, foi para Curitiba. Lá, achou que
recomeçaria tranquila, mas, depois de um tempo ele havia descoberto. Acordou e,
ao seu lado na cama, havia um revólver. Minha prima ficou transtornada,
resolveu mudar-se mais uma vez. Dessa vez para Cuiabá.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Suspirou.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">- Há um tempo não falo com ela.
Não sei como reagiria numa situação dessas. Claro, já tive um episódio
estranho, mas não como este!</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Agora tinha mais atenção do que
no início da história.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">-Estava voltando de Sorocaba de
ônibus, era meio-dia, ou uma hora. Não lembro. Então chegou uma sms no celular.
Dizia “oi, tudo bem? Para quem escrevo?” ou algo assim. Era de um número fora
da minha lista de contatos, ali da região mesmo. Perguntou se eu era homem ou
mulher. Daí descobri que era homem. Conversamos muito; perguntou como eram meus
cabelos. Fui me acostumando com a cadência da conversa, esperando as sms. Achei
aquilo uma aventura interessante. O que fazia da vida, se trabalhava, o que
gostava de fazer nas horas vagas, qual tipo de música ouvia. No fim, uma
pergunta ficou no ar... Ele não respondeu mais. Fiquei esperando mais um tempo,
mas resolvi não mandar mais nenhuma. Sequer soube o nome dele. Nem ele o meu. Às
vezes penso sobre aquele dia. É engraçado como duas pessoas tem formas tão
diversas de se encontrar. E ao mesmo tempo isso é tão perigoso.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;">Riu reticente, olhando para algum
ponto no infinito. As pessoas conversavam, respondiam. Sua atenção foi para o
espaço. Algo emoliente havia batido contra seu peito, agora tudo estava meio
aquoso, suave.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-72787684152525399462013-04-04T21:06:00.003-03:002013-07-16T14:39:15.628-03:00Desconstrução.<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
**</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
O sujeito, um pouco magro e
precisando de exercícios físicos, entrou no corredor à esquerda e foi andando,
contando mentalmente até chegar à sala em que devia entrar.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Bateu duas vezes e, pelo som
abafado que vinha de lá de dentro, soube que podia entrar. A sala – ou
consultório, ou escritório, ou seja lá como queriam que se chamasse, era sóbria
e masculina. A vista assustadora, emoldurada por janelas que iam até o teto,
fizeram-no tremer de covardia mais uma vez.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Devido a <i>tudo </i>que já havia visto e temia ver a cada instante, era tomado por
um arrepio incontrolável; um medo que fazia arrepiar sua nuca e espinha. Uma
covardia legítima da vida.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Entre, entre
- o homem de voz grave gesticulou impacientemente com os braços, para que o
rapaz entrasse logo – acho que já disse ao senhor, não precisa bater antes de
entrar. Sem cerimônias.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
O rapaz deu uns
passos até o senhor, que o contemplava de sua mesa, cotovelos no vidro frio. Sentou-se
defronte e esperou que o anfitrião começasse a falar.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Em quê paramos,
Manu? – o homem perguntava perguntas retóricas. Manu sabia quando ficar quieto;
quando dar sinal com a cabeça e, se a pausa fosse um pouco mais longa, era hora
de falar.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Paramos... Em
qualquer coisa sobre meu jardim de infância. Eu falava da Diana.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Quanto tempo
você disse que não a vê?</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Ele ri
baixinho. Não via Diana há dois anos. Uma frieza ao constatar isso: fazia dois
anos que não via sua irmã. Flashes das brincadeiras estúpidas, da pancadaria
que não doía. Ela era o chefe, Manu só tinha medo de qualquer consequência,
seja em forma de castigo ou algum machucado. Diana ria, ria e ria.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
E a vez em que
Diana estava tão quieta, Manu não soube contornar. Vê-la ali, quieta de forma
não habitual. Quieta de forma não natural. Manu a provocou, foi seu momento de
suprema coragem, foi a vez de Manu rir. Já passavam pela fase em que as partes
do corpo crescem desordenadamente, os braços são compridos demais, as pernas
tem pelos. Manu ria e caçoava, pois mamãe não deixava Diana tirar os pelinhos
loiros e ralos de suas pernas. A menina
vivia enfiada num jeans, numa camiseta amarrada na cintura fina. E desta vez
estava quieta demais para o deleite de Manu.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
A lembrança era
nítida e o estômago de Manu não aguentava tudo isso. Como num holograma
esverdeado, Diana surgiu em sua frente naquele dia em que Manu registraria para
sempre como um divisor de águas da relação dos dois. </div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Quando
completaram 15 anos, os gêmeos Manu e Diana, a menina enveredou-se num universo
que Manu não via sentido.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
A confusão e a
dúvida que surgiram quando tudo mudou, bem registrados na excepcional memória
de Manu, estavam mais nítidos do que nunca. </div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Lembrou-se da
tarde em que Diana trouxe colegas do colégio para qualquer coisa à tarde em sua
casa. Diana, num surto normal de adolescência, excluiu Manu em todo o evento.
Fez de Manu um espectro, invisível. De fato, sem Diana, Manu era invisível. </div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Foi
abaladíssimo para seu quarto e devorou vários gibis a tarde toda. Até que não
houvesse som de nenhum estrangeiro no andar de baixo. Até que ouvisse Diana
entrando em seu quarto, colado com o dele, e batesse a porta.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
E tudo não
passava de um mix de hormônios e cultura pop.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Faz dois
anos.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Como você vê
a ausência dela, hoje em dia?</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- A ausência,
que o senhor diz, eu notei quando éramos adolescentes. Não sei se lido muito
bem com isso. </div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
O corpo de Manu
tremia, tornava-se um pouco menos robusto, a pele cheia de espinhas, o cabelo
alvoroçado. Manu voltou a ser adolescente. Seu assunto com Diana, congelado em
seus órgãos internos, se retomado, se lembrado, faziam-no adolescente mais uma
vez. Até quando pensava em Diana, era um adolescente que remoia.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Ainda penso
em Diana como um adolescente. O senhor acha isso estranho?</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Acho que devido
a seu <i>problema</i>, posso entender o
porquê.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
O anfitrião fez
trejeitos com o corpo, indicando que iria mudar de assunto. Manu esperou que
ele se espreguiçasse e mudasse mais uma vez a posição dos braços e pernas e
escutou.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Bom. Temos um
bom material aqui, Manu. Talvez seja de grande utilidade, não é?</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Mas...? –
Interrompeu o jovem.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Mas receio
que esses papéis não passam de subterfúgios.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Subterfúgios
para o assunto que lhe interessa.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- A mim não,
mas a quem me contratou – O senhor respirou fundo, arcando os ombros, numa
espécie de dança de competição entre machos, intimidando o oponente. E falou,
baixinho - preciso da versão detalhada
do momento de seu nascimento.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Manu riu alto.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Vamos
recorrer à regressão? Eletrodos? Eletroencefalograma? O que o senhor <i>quer </i>de mim?</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
O desdém
fingido de Manu era fruto de anos de prática. Depois de uma adolescência em
atrito consigo mesmo, tentando convencer as pessoas que ia “bem”. Ir “bem” era
desdenhar e mostrar orgulho. Orgulho sem ter feito nada que valesse. Atrás do orgulho, uma camada de medo
legítimo. Com dezoito anos, deu conta que não pensava no futuro. É claro, na
onda em que foi levado no final do colegial, havia optado por um curso em uma faculdade
em São Paulo. Entre estudos e caminhadas
solitárias pela cidade, Manu conseguiu a vaga. Logo que se mudasse para São
Paulo, ao desempacotar suas coisas medíocres pelo chão do apartamento
embolorado, daria conta que não pensava no futuro. Nas vezes em que lhe
ocorriam pensamentos obscuros como esses, um frio surgia no fundo do estômago e
irradiava letalmente pelo corpo, dando-lhe a sensação de falta de chão.
Sensação comum àquela de quando lembrava que ia <i>morrer</i>. Falta de chão, formigamentos, uma presença irritante e tão,
tão certa. Sua presença.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Apesar da
gravidade deste pensamento, Manu não fez nada.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Sua rotina era
essa: desviar de seus medos, suas lembranças sombrias. Fechar-se para que
ninguém notasse sua covardia. Orgulhar-se. Manu era um bom ator.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Três anos
depois de tal pensamento, recebeu o telefonema saindo do banho. Entre aula e
trabalho. Não pôde entender prontamente o que queriam lhe oferecer e aceitou.
Ofereciam dinheiro em troca de. Ofereciam dinheiro em troca de entrevistas com
jovens que. Ofereciam dinheiro em troca de entrevistas com jovens que se
enquadrem no perfil e. E Manu tinha esse perfil. Departamento de Psicologia da
faculdade, talvez.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Não deu a
devida atenção, porque estava atrasado para o trabalho. Lembrou-se com precisão
que vestiu a meia no pé esquerdo e teve que girá-la para a posição correta.
Dinheiro em troca de. Calçou os sapatos, revezando o ombro em que ia o celular.
Jovens que se enquadrem no perfil. E o senhor se adéqua a este perfil. E
respondia “ahã” a cada pequena pausa da moça do outro lado da linha. Antes que
a moça robótica pudesse falar qualquer coisa em adição, Manu respondeu, Sim,
por que não? Por favor, me envie o endereço por e-mail. Meu e-mail é...tem uma
caneta? OK... <a href="mailto:manu.prt@yahoo.com">manu.prt@yahoo.com</a>. E, me
desculpe, estou atrasadíssimo...</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
E tratou de
desligar o celular e correr à rua, deixando a moça sem direito de resposta.
Lembrou-se que lhe ocorreu que a moça não fosse lhe enviar e-mail nenhum. E nem
se preocupava.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Mas estava ali. Esta e qualquer outra
lembrança que brincasse em lembrar: acessíveis como uma gavetinha de alça
confortável, que deslizaria até sua vista. Com material fácil de entender e
ler. Até algumas fotografias e ilustrações.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Sem regressão
ou qualquer parafernália.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Então talvez queira o telefone de Diana,
afinal, ela nasceu junto comigo.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
- Não, só você
tem algo a me dizer Manu. Diana mostrou-se por fora do assunto quando perguntei
a ela.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Seu corpo
tremeu de um ciúme adolescente.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Analisou numa
fração de tempo o tamanho de seus braços, o tamanho dos braços do homem sentado
a sua frente, as saídas possíveis, armas letais.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
O momento de
seu nascimento. De todas as lembranças, esta.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Dentre correr,
machucar um inimigo: contar seu segredo. Seria em vão?</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Manu ajeitou-se
na cadeira, mostrando várias caras para seu interrogador, indo de raiva à frustração.
À aceitação.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Manu encarou o
homem, lívido. Acabaria logo com aquilo. Levantou-se, empurrou a cadeira para o
outro lado da mesa, de modo que ficassem de frente um ao outro.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Lenta e
cadenciadamente sussurrou.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
Baleias,
carrosséis, milk-shakes, bombinhas, araras-azuis e capivaras.</div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 256.5pt; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-81895518674544350102013-02-07T23:45:00.004-02:002013-02-07T23:45:55.312-02:00Breve resumo do desfecho de um inferno astral.<div style="text-align: justify;">
Você não vem jantar? </div>
<div style="text-align: justify;">
Não consegue se conter. Os olhos escapam de seu desejo. Não é ofensivo, é auto-ofensivo. Vergonha alheia. Quando se vê, os olhos já retratam seu desejo, desviando a cabeça. Animal.</div>
<div style="text-align: justify;">
Não consegue se manter: há um fluxo de qualquer coisa inacabada na região do baixo ventre. Somos jovens, somos jovens! Há mais quinhentas e trinta e três possibilidades pela frente, tentativas, pessoas. Pessoas indo direto para o Orgânico; às vezes para o Reciclável.</div>
<div style="text-align: justify;">
Sou eu, sou jovem, estou aqui, me veja, me venere, SOU EU!</div>
<div style="text-align: justify;">
Quero mostrar o quanto consigo ser interessante. Curiosa e despreocupadamente interessante. Cabelos, pernas, e os olhos que teimam. </div>
<div style="text-align: justify;">
Não há planos, não há linha de pensamento... Sou um lobo solitário e quero fazer o bem em detrimento do meu próprio.</div>
<div style="text-align: justify;">
Lembranças não morrem jamais. Isso ninguém tira (?).</div>
<div style="text-align: justify;">
Mas há tanto a viver!</div>
<div style="text-align: justify;">
Pare de cuidar de mim; desse acalento e segurança que não me pertencem.</div>
<div style="text-align: justify;">
Não, não tentarei ficar bem. Não tentarei ficar feliz. Quero que a TV me distraia. Quero que as coisinhas me distraiam. Quero que as luzes me ofusquem e me deixem em transe eterno.</div>
<div style="text-align: justify;">
Se você me chamar pra jantar, ou apagar a luz, ficarei com medo. E como irei encarar a mim mesmo?</div>
s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-18797529254028055702012-12-28T13:13:00.000-02:002012-12-28T13:13:40.310-02:00A Lembrança / A Imaginação / O Projeto / A Pessoa Ideal<br />
<div class="MsoNormal">
-A lembrança.</div>
<div class="MsoNormal">
Tenho nítido o rosto na memória. Quando o sol batia nos
olhos, semicerrava o olhar antes de me lançar com ares de crítica. Não faz mal,
sua barba já se se tornava grisalha ao que diz minha mãe sobre preocupação.</div>
<div class="MsoNormal">
Agora você é todo sépia.</div>
<div class="MsoNormal">
Pessoas mortas, esquecidas. De certa forma morto; certa
forma ausente. O físico, a maçã e sua textura.</div>
<div class="MsoNormal">
Só se morre quando se esquece – tenho assassinado friamente
muitos rostos.</div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
-A imaginação.</div>
<div class="MsoNormal">
O louco é rei!</div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
-O projeto.</div>
<div class="MsoNormal">
Lâmpada de 40 Watts, e um start de lápis, régua e compasso.
Dezenas de folhas, folhas amassadas, cálculos e coceira na cabeça.</div>
<div class="MsoNormal">
Cigarros, cigarros, cigarros!</div>
<div class="MsoNormal">
Fumaça ocre, frustation.</div>
<div class="MsoNormal">
Quem pensou isso primeiro? Quem?? De que mente cruel saiu
essa tortura?</div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
-A pessoa ideal</div>
<div class="MsoNormal">
Disse que tinha tanto em comum com ele(a), que até se
assustava. E, veja, julgava-se estranho(a), weird. E que talvez fosse alguma
brincadeira de alguém que o(a) conhecia muito, muito bem. Ou algo do governo.</div>
<div class="MsoNormal">
“Você não existe.”</div>
s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-9942653854046433552012-06-16T18:18:00.000-03:002012-06-16T18:23:35.825-03:00Cabeça de Nóis Tudo<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;">Eis a Cabeça de Nóis Tudo</span><br />
<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;">Algoz de seu próprio pescoço</span><br />
<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;">Bálsamo do próprio gozo</span><br />
<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;">Avesso dos vasos sanguíneos</span><br />
<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;"><br /></span><br />
<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;">Eis a Marcha à ré do Mundo </span><br />
<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;">Um labirinto profundo </span><br />
<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;">Onde os caminhos são negros </span><br />
<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;">E que tudo se desfaz</span><br />
<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;"><br /></span><br />
<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;">Da luz que cintila </span><br />
<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;">Do riso de agonia</span><br />
<span style="color: #cc0000; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif; font-size: large;">Da necessidade crônica de paz</span>s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-88584347664861595472012-03-20T22:45:00.001-03:002012-03-20T22:45:29.422-03:00O boneco de pelúcia de KantImmanuel Kant, apesar de agradavelmente sociável, nunca se casou e tampouco saiu de sua cidade natal. Contudo, para o fascínio dos barbudos de aros-grossos, ele é tido como algum tipo de marco em suas aulas de Filosofia.
Tinha o costume de tomar um solzinho e caminhar, todo dia, às 3h30 pm. Sofria bullying. Bem, se não sofria, pelo menos era alvo de fofoqueiras.
Talvez sonhasse com ET’s e, sobressaltado em algumas madrugadas, acordasse para tomar um copo de água, ainda com o rosto pouco familiar de um extraterrestre nos olhos.
Talvez Kant provavelmente tivesse um hobbie pouco ortodoxo, como ficar repetindo mentalmente “Agora... agora... agora... agora” e ter o deleite constatar que sua consciência é diferente a cada instante.
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgEVe_PCD_hWRGl4yPJITeIgSBn8m5OvuChSApAHwsFxTloFPw36gWNZH2VNNEfzRrupDumK-Cns0N-eHGaFO4W39k3_AmFfCOZ5ivWmfClgyyH2YfAizTDLs4nW1LD1UvQZlreGg/s1600/imannuelkant.jpg" imageanchor="1" style="margin-left:1em; margin-right:1em"><img border="0" height="400" width="360" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgEVe_PCD_hWRGl4yPJITeIgSBn8m5OvuChSApAHwsFxTloFPw36gWNZH2VNNEfzRrupDumK-Cns0N-eHGaFO4W39k3_AmFfCOZ5ivWmfClgyyH2YfAizTDLs4nW1LD1UvQZlreGg/s400/imannuelkant.jpg" /></a></div>
Ou talvez sentasse defronte com o relógio da cidade e ficasse observando os ponteiros girando devagar, enquanto alimentava pombos com miolo de pão.
O certo é que não há meios de perdoá-lo por seu penteado. Ou pelas vezes que vangloriou-se, numa roda de amigos, enchendo a boca para dizer “Coisa em Si”.
Mas podemos nos compadecer dele que, além de sonhar com ET’s, ainda possuía, depois de adulto (assim suponho) um medo irracional de sua mãe e de Deus (E para dormir acalentado, pode ser que dormisse com um ursinho de pelúcias...).
Talvez a fama tivesse subido a seus lindos cachinhos, ou tivesse brilho nos olhos por algum aluno seu.
Sua risada talvez fosse alta e inconveniente e suas piadas sem graça nenhuma.
E talvez tivesse perdido um dia ou dois transformando rascunhos em bolas de papel. Muitas delas.
Nunca se sabe, em se tratando de Kant.s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-83319834146068289592012-03-11T22:11:00.000-03:002012-03-11T22:11:34.587-03:00Talvez eu não concorde com a "linha do tempo" do Facebook, por exemplo...A faixa dos 20 aos 30 anos é a época mais criativa de uma pessoa. Curiosamente, quem quer que tenha dividido a vida em anos, talvez o tenha feito de forma coerente. Não sei se é porque vivemos conforme a idade que temos ou porque a idade que temos nos faz viver de certa forma. Assim como gente feia costuma ser legal e, gente bonita, geralmente, costuma ser arrogante e chata (ok, isso não precisava estar escrito aqui, não é científico).
Paradigmas. Quando eu era mais nova, lembro do meu irmão falando, ou melhor, papagaiando uma frase que ouvira em qualquer lugar: "devemos quebrar paradigmas". Eu não sabia o que significava, somente tinha um feeling. Não quebramos paradigmas; quase sempre, só seguimos em frente.
Não sei o que significa passar pelo planeta Terra e viver ínfimos oitenta e cinco anos, em média, e vangloriar-se de ter vivido tanto, talvez tão intensamente e morrer dignamente com uma bagagem a que se julga "Sabedoria". É como se a pessoa pensasse "ótimo, agora que tenho 30 anos, tenho experiência mediana" ou "muito bem, cheguei aos 40, já posso ter uma crise de meia idade".
A vida costuma ter urgência por padrões. Eu vejo padrões de cores em toda parte; padrões de comportamento de tribos, de idades; de opiniões, música, gostos. Quase tudo chocando de frente com algo, conflituoso. Um negando o outro, um anulando o outro. Mas sempre sendo retomando um pouco mais a frente. Talvez eu não concorde com a "linha do tempo" do Facebook, por exemplo. E sim com a espiral de tempo de Hegel.
Talvez eu ache que, daqui cinco anos, quando completar trinta anos, eu vá matar a pessoa que fui na faixa dos vinte. Um pouco menos criativa, claro. Porque a faixa dos 20 aos 30 anos é a época mais criativa de uma pessoa.
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<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj75838PkVTYPt7nOD26ICr6Ly4FNAkcT0S8Uc76m1M6otM3TJSQbHUKH_QZxl97H8GeZQ_BaZQXbWAKaGDF4psDXLildRWt8LeQECU9YATEzBVdGoUEvTNmLcz_oIBrblb3Ewfyw/s1600/23616_Nautilusmuschel_2.jpg" imageanchor="1" style="margin-left:1em; margin-right:1em"><img border="0" height="317" width="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj75838PkVTYPt7nOD26ICr6Ly4FNAkcT0S8Uc76m1M6otM3TJSQbHUKH_QZxl97H8GeZQ_BaZQXbWAKaGDF4psDXLildRWt8LeQECU9YATEzBVdGoUEvTNmLcz_oIBrblb3Ewfyw/s400/23616_Nautilusmuschel_2.jpg" /></a></div>
(continua)s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-7844842322969240872011-11-27T14:05:00.001-02:002011-11-27T14:22:46.420-02:00Os lapsos estão cada vez mais contínuos / Em seguida, entabulamos uma conversa tão louca que até hoje duvido<span style="font-weight:bold;">Os lapsos estão cada vez mais contínuos.</span><br /><br />Última rodoviária para pegar os últimos passageiros, e então o ônibus partiria sem mais transtornos. <br />“Você é de São José? Sou de Jacareí”. Algumas pessoas dialogam sozinhas; não precisam necessariamente de uma resposta. Não sei o que há de errado com as palavras que algumas pessoas precisam livrar-se delas a qualquer custo. Geralmente, eu sempre concordo com a cabeça; ou então digo “é verdade”. Isso encerra qualquer conversa fiada, se a pessoa tiver bom senso.<br />Passou-se um tempo e/ou dormi – minha memória não anda tão bem assim pra lembrar da sucessão de coisas que aconteceram na semana passada (sim, isso é grave); mas houve uma hora que o senhor veio me falar que fazia parte do “Amigos do Fusca” e que certamente eu poderia tê-lo visto na TV por conta disso. “Ajudamos o pessoal, arrecadamos cestas básicas, essas coisas...”.<br /><br /><br /><span style="font-weight:bold;">Em seguida, entabulamos uma conversa tão louca que até hoje duvido.<br /></span><br />“Você estuda <span style="font-style:italic;">Química</span>? – Mas que coincidência, eu trabalho com papel e celulose há 32 anos!”. Não propriamente Química mas, sim, uma coincidência. Contou que estava aposentando. “Cansei, quero fazer o que gosto. E o que gosto é andar de bicicleta. Já cobri São Paulo, Rio e o Paraná. Ainda quero percorrer o Brasil inteiro.” Me contou em detalhes da vez que cobriu os três estados, as cidades por onde passou, o cansaço. Tinha até aparecido na TV. “Eu chegava nas cidades fedendo, cansado depois de horas pedalando. Dependendo da cidade, o prefeito tava me esperando. Em outras, tinha uma multidão com palco e tudo esperando eu chegar”. Perguntei como era o treino pra ter tanta resistência assim. “Um amador pode pedalar uma, duas horas. Mas depois, as panturrilhas começam a queimar; o fracasso vem. O treino é o seguinte: um dia você pedala dez quilômetros, e vai aumentando dia a dia. Quando você atingir os cem quilômetros, você pode fazer o que eu faço.” E me contou que sofreu acidente parado, no semáforo, logo depois de sua maratona - um momento de má sorte. Teve que se afastar dois anos depois de fazer cirurgia no ombro devido à fratura exposta. O motociclista que colidiu com ele havia também se machucado, mas não tão gravemente. E chorava de dor, disse ele. “Não seja mole, rapaz. Veja <span style="font-style:italic;">isto</span>” disse ele, mostrando o osso exposto.<br />Aquele caminho que fazíamos, de mais ou menos duas horas de carro, ele também costumava fazer de bicicleta. Pegava a bicicleta e pedalava de Jacareí até Cunha, cidade dos pais dele. “Gosto de treinar lá, tem mais morros e o treino é mais forte. Agora preciso começar a me preparar. Em Março quero começar pelo Mato Grosso. Será que agüento até lá? Tenho sessenta e dois anos!” E riu, mostrando seus pés de galinha.<br />Me contou outras coisas, que o motivo daquela viagem era pegar os papéis de seu divórcio. Estava separado de sua esposa já fazia oito anos, mas vivendo sob o mesmo teto. “Somos amigos, nos respeitamos. Pra viver com alguém que você já não ama romanticamente, tem que ser na amizade. Agora, com o divórcio, me mudei; tenho minha própria casa, faço o que quero”. Contou dos filhos, duas cadeirantes, um adotivo. Contou da família, que quase toda é de comerciantes.<br />E, por fim, explicou-me em detalhes o processo de celulose e prometeu me enviar pacotinhos de celulose pras minhas aulas na faculdade.<br />Claro que não vi a hora passar e já estávamos chegando à rodoviária. E ele: “Que cansaço. Quando chegar em casa ainda tenho que fazer o jantar”.<br /> E eu, intrigada, me despedi.s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-16171537660853713792011-11-22T11:10:00.001-02:002011-11-22T11:12:40.025-02:00Uma Descrição da Dor / Uma Longa Hora Depois / Acabei dormindo por cinquenta minutos na poltrona nove imaginárias; tal como anos bissextos.<strong>Uma Descrição da Dor.</strong><br /><br />Ando sempre atrasada como se o azar colaborasse com isso. Porque quem planeja não deveria se atrasar como eu o faço. Tratam-se de sucessões de atrasos, de “não acredito que você ainda não sabia disso” , de dp’s, de estar um triz de distância de onde eu devia estar agora.<br />Eis que estava em tempo de pegar o ônibus, três da tarde sairia, eram duas e cinquenta e seis; tempo suficiente para os 50 metros que me restavam. Duas e cinquenta e sete o ônibus passou correndo ali na frente, no que parecia a exceção de se sair mais cedo que o motorista fez. Exceções sempre ferem uns desavisados que esperam por regra. Planejar horários e crer piamente que dá pra percorrer 50 metros em 3 minutos deixa de ser uma verdade newtoniana assim que o motorista toma a exceção de sair mais cedo.<br />Minhas panturrilhas queimavam depois do meu trote desajeitado: calça jeans, bolsa, calor. Agora eu podia fazer tudo sem hora pra fazer nada. Ótimo: uma hora inteira esperando o próximo ônibus na rodoviária. Vendo novela e bebendo Schweppes.<br /><br /><strong>Uma Longa Hora Depois.</strong><br /><br />Sete ônibus passantes (nenhum para meu destino), um refrigerante, oito balas de goma, meia novela e um pouco de pessimismo depois; finalmente meu ônibus estacionou na plataforma. Naturalmente, me levantei e fui na direção; dando o nítido aviso de que eu merecia entrar primeiro já que havia esperado uma hora ali.<br />Poltrona nove. Minha propriedade temporária: poltrona nove. Ninguém me incomodaria pra sair do lugar, o que acontece muito nesses ônibus que pegam punhados de gente pelo caminho que se sentam nos lugares demarcados dos passageiros da próxima rodoviária. Enfim.<br />Um, dois; três, quatro; cinco, seis; sete, oito; onze, doze. O tipo de coisa que só acontece em desaniversários, decerto.<br /><br /><strong>Acabei dormindo por cinquenta minutos na poltrona nove imaginárias; tal como anos bissextos. </strong><br /><br />Forcei-me a despertar, porque podia estar chegando. Engano meu, visto o trânsito. Nada de pânico à partir dali: pelo menos ninguém me tirou do meu lugar. O lugar ao meu lado, outrora vazio, foi ocupado por um senhor de meia-idade. Ao que abri os olhos, ele veio falar que estava ali porque algum passageiro malvado havia sentado no lugar dele. “É chato pegar alguém no lugar que já estava marcado, mas também é chato pedir pra sair”. Então expliquei a ele, com a sabedoria de quem toma aquele itinerário há um tempão, que a culpa era da viação por ir lotando o ônibus no caminho sem verificar as poltronas. Acho que ele entendeu.<br /><br /><strong>Continua...</strong>s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-22169456300586396932011-07-22T00:01:00.003-03:002011-07-22T01:07:48.448-03:00Shampoo<a onblur="try {parent.deselectBloggerImageGracefully();} catch(e) {}" href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhCk1btzvtUUAjE-mbVmEQTIGY_m5ke3qsyWAyYtwrWXRnOp_RNVi1VNaoaGxyBchlqGH68avcGk02KtwzTDU13MtZb4OU0COslGGH7vd6kykDhdN4usN4ld7S6iLXU8J_R-I-JHw/s1600/psicose.jpg"><img style="display:block; margin:0px auto 10px; text-align:center;cursor:pointer; cursor:hand;width: 320px; height: 237px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhCk1btzvtUUAjE-mbVmEQTIGY_m5ke3qsyWAyYtwrWXRnOp_RNVi1VNaoaGxyBchlqGH68avcGk02KtwzTDU13MtZb4OU0COslGGH7vd6kykDhdN4usN4ld7S6iLXU8J_R-I-JHw/s400/psicose.jpg" border="0" alt=""id="BLOGGER_PHOTO_ID_5632023029653805794" /></a><br /><br />Andava pensando muito no egoísmo alheio e na falta de tato. A mão, já macia por causa da água quente e sabonete, fazia seu percurso por limpar o corpo. <br />Review do dia, alguém tinha sido pouco cortês; mas assim são as pessoas e não se pode decepcionar com obviedades. Nada de sentimentalismos.<br />Os olhos voltaram para a altura da basculante, vidro de shampoo, "contém extrato de alho", ótimo, talvez eu me livre desses vampiros.<br />Egoísmo, rudeza...um pouco de raiva emanava de seu corpo e se misturava com os vapores do banho. Nada como um banho quente para se esfriar a cabeça.<br />Mais um minuto ali e já podia sentir a pele esticada, como se o corpo fosse inflar e se romper. Mas isso era ridículo e deixou essa visão de lado. Jamais: estamos cá presos, envoltos por uma casca. Ilhas.<br />Desligou o chuveiro e perdeu-se no vapor, de olhos fechados. Era difícil respirar, e quando tentava um fôlego novo, o vapor entrava por sua garganta, fazendo tossir. Por vezes também se perdia em bobagens. Quantas pessoas terminaram o banho nesse instante? Quanto de água foi ralo abaixo? Se todas as pessoas pensam que as pessoas são egoístas, quem está contra nós? ... Ilhas móveis.<br />Lembrou-se novamente do episódio e engoliu em seco. Amargo. Há um sequência para o que sentiu em resposta: humilhação, tontura aspereza. A toalha áspera secava o corpo e de novo, a sensação de que a pele ia se romper e, tudo o que estava contido ia se espalhar ao universo num panteísmo divino.<br />Não seja idiota, idealismo tem limites.<br />Enrolou-se na toalha e abriu a porta do banheiro para sair no ar gélido e desconfortável da realidade. Sem escudos, apenas uma toalha.s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-89158406227962802452011-06-04T21:33:00.002-03:002011-06-04T21:43:08.943-03:00Qualquer discussão é uma disputa de egos e nada além disso e de capricho. Daí surge a grande espiral que se abre ao infinito recheada de ideias, vomitadas. Aos olhos atentos, espectadores, passivos, inertes; não se saiu do cerne de tudo. Não se saiu do marco zero do cronômetro.<br /><br />*<br /><br />Quando era criança, do tipo mais novo e de mente mais limpa, lembro-me que minha mãe se chamava simplesmente mãe. Perguntaram-me uma vez, qual o nome da sua mãe? Não sei.<br />Mente limpa, podia enxergar auras, tamanha a ingenuidade. Só a aura de minha mãe, envolta numa redoma de importância.<br />Um dia vi minha mãe chorando. Não, ela não podia chorar; nada podia tocar nesse envoltório, na superfície do lago tranquilo.<br />Por anos não consegui deixar rolar uma lágrima sequer.<br /><br />*s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-74237125877205295932010-12-10T17:57:00.002-02:002010-12-10T23:39:43.484-02:00Transcendente.<a onblur="try {parent.deselectBloggerImageGracefully();} catch(e) {}" href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjiEKi8OEPti_Mu9d3m8WgIcXzRNZjEoS9RGkA_5lmbiNSgMBM1dYd1dyYjg1M_6nyGSJzl0XSXH1j3YReryj8MI-6Cgm-J7FDlIzoBaVVRVSLrij4iYId3XQTR0B7J_fIQvbDn4Q/s1600/cigarro-fumaca.jpg"><img style="display:block; margin:0px auto 10px; text-align:center;cursor:pointer; cursor:hand;width: 320px; height: 213px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjiEKi8OEPti_Mu9d3m8WgIcXzRNZjEoS9RGkA_5lmbiNSgMBM1dYd1dyYjg1M_6nyGSJzl0XSXH1j3YReryj8MI-6Cgm-J7FDlIzoBaVVRVSLrij4iYId3XQTR0B7J_fIQvbDn4Q/s320/cigarro-fumaca.jpg" border="0" alt=""id="BLOGGER_PHOTO_ID_5549146567546347106" /></a><br /><br /><br />Estava assistindo a um documentário sobre pessoas que fazem documentários sobre documentários e se aborreceu.<br />Não que tivesse alguma objeção à rotatividade cotidiana e a desenfreada vida agitada que estava acostumado a levar. Não. Se parasse, o que restava era.<br />Mas, devia haver um momento em que a recompensa, a luz brilhante brilharia em sua cara. Devia haver, para que o Universo não entrasse num colapso por balanço de massa mal feito, em excesso de porcarias e pessimismo. Deve haver, pensou alto, há de ter uma razão pra esta corrida contra o tempo.<br />Pensou de forma pejorativa sobre convertidos e beatos e todo o tipo de crentes; crentes crendo na recompensa, na luz, seguindo regras pra ter um pedaço do céu, comprando lascas falsificadas da cruz pra que tivessem alma.<br />Invejou quem tinha alma. Invejou todos que tinham crenças. Quis ser todos os fiéis e seus dízimos, toda a forma de paz, consolo e conformismo. Quis entoar um mantra, mas não soube como começar.<br />O ambiente cheirava à sabonete e cigarros. Música ligada, filete de fumaça. Nada mais, nenhum santo ou qualquer vida sobrenatural. Nada além do concreto, físico o suficiente para deprimí-lo, pra botar mais medo. Vou pintar a parede de verde, pensou alto mais uma vez, num átimo de segundo.<br />Notadamente não era tarde demais: não há tempo fora do relógio e, quando olhou para o que estava afixado na parede monocromática, viu que nem um minuto havia passado.<br />Droga.<br />E acendeu outro cigarro, e a música se potencializou. Todos precisam de trilha sonora.<br />Ansiedade já foi se dissipando. Voltou ao documentário ao som de música. Não precisava entender nenhum dos dois, mas deviam estar ligados ao mesmo tempo.<br />Um dia, dois dias, três dias, uma hora. O cigarro tinha fim e logo acendia outro.<br />E quando acabou o documentário, apagou a TV; desligou a música. Tudo escuro e teve medo.s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-35702494780294392062010-10-07T14:25:00.003-03:002010-10-07T15:03:02.967-03:00Descrição qualquer.O trajeto é simples: tranco a porta e automaticamente atravesso a rua, salpicando os sapatos de cascalho que jogaram sobre as pedras. E então, quando lá estou no outro passeio, o que tem motivos que me remetem a qualquer calçadão praiano, ouço o som de quando andava por algum parque de chão forrado de pedrinhas. É inevitável pensar isso, mesmo que não me remeta a algum sentimentalismo em relação à cena. Mesmo que apenas haja uma conexão por comparação direta, algo próprio do meu cérebro em particular.<br />Ao que já está ligado ao cerebelo, não preciso pensar no trajeto, já feito tantas vezes que talvez até os passos sejam contados sem que eu tenha consciência de sua exatidão. Virar a esquina que já está próxima só é percebido quando a rajada de vento, aprisionada nas perpendicularidades das esquinas, se apodera dos meus cabelos jogando-os para trás. Continuo os passos, agora sem o som das pedrinhas; o que me permite perceber os carros, se passam; as pessoas em torno, se cruzam; o ar em geral da rua em movimento. Acato tudo caminhando, nada me acrescenta. Chego ao destino que é logo ali, tão próximo de casa.<br />Uma porção de informações, aquarelas para meus olhos, tantas construções que até o chão que eu piso fora forjado.<br />E nada disso tem importância, nem pra mim, nem pra nenhum outro por aqui.<br />Deve ser algum tipo de defesa.s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-13830112153791245152010-07-27T16:39:00.003-03:002010-07-27T17:17:18.388-03:00TrêsSe ando pela rua, é sempre tentando acertar meus passos. É inevitável pensar que os outros que andam comigo, ou em minha direção têm rumo definido e passos firmes.<br />Sou um(a) sonhador(a), e flutuo acima dos meus pés e das minhas expectativas. Com um sentimento nítido de que não sou daqui, permaneço de onde saí. Mesmo não sabendo que lugar é. Um tipo de inércia sem corpo; tipo uma marca de nascença que não se pode ver.<br />Das grandes indagações que ousei pensar, a que mais pesa é a necessidade de estar sempre indagando sem obter uma explicação, uma boa explicação.<br />Mais fácil seria se a vida passasse sem a gravidade dessa grande dúvida.<br />Mas sem a gravidade, não seria atingida a profundidade desejada.<br /><br />****<br /><br /><br />Estou olhando para fora e, mesmo que não quisesse, posso sentir o cheiro da chuva. A chegada dela me arrepia a pele e faz balançar as árvores.<br />Ouvi de cinco pessoas diferentes, cinco relatos totalmente inesperados do que possa ser a chegada da chuva.<br />Perguntaram, na minha vez, qual meu olhar sobre tudo. Dei a entender que o cinzento que tomava o céu não só era amedrontador, como uma força impossível de se deter (sempre incapaz de me expressar verbalmente). Perguntaram-me, então, se a vinda da chuva me fazia mal. "Não. Sobretudo me faz bem. Forças assim que me fazem parar". Não sei o que poderia me deter não fosse uma chuva vindo. Teria que alçar voo noutro momento.<br /><br />****<br /><br />É a visão de quem tudo vê! A cabeça de quem tudo pensa! O impossível de quem tudo pode fazer. <br />Ideal bobo e desnecessário(?).s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-16757864129416927422010-07-14T11:03:00.002-03:002010-07-14T11:09:16.030-03:00Fragmentado.***<br /><br />Dentro do metrô é praticamente noite. As vezes em que a máquina passa por trechos descobertos não contam: no metrô só se faz noite, e as luzes sempre estão acesas. Isso dá motivo para aquela lâmpada piscar estrategicamente, conferindo uma aura que eu conheço bem.<br />Bando de répteis. Isso de “sangue-frio” vai além de um comportamento macabro ou estômago forte demais. Um bando de répteis com rostos cinzas, olhando pro nada, olhando para ninguém. Não se encaram, desviam olhares. Confissão de culpa. É o ar doentio do metrô, do subsolo; como uma pedra quente e um lagarto. <br />Seguram-se, guiados pela inércia; mecanimanente entram e saem.<br />Então você disse de súbito (me assustei) que pra quebrar o transe, nem um balde de água fria. Como se lesse meus pensamentos. E lia sim. Éramos dois dos zumbis com consciência.<br />Estava claro porque não respondi logo; porque não respondi hora alguma. “Tenho certeza que nos conhecemos”, aquela velha sentença. Que lembrava vagamente. Que meu rosto era familiar. Que tinha que.<br />As pessoas são muito iguais, mesmas fôrmas. Rostos similares passeiam por aí simultaneamente. Criatividade alguma, limitação. Sobretudo ali; ali são cinzas. Todos os gatos são pardos.<br />Podia ser que já tivéssemos nos cruzado pelas ruas, cada qual fitando o chão. Natural. Você sorria, havia descoberto um continente. Ou melhor, havia notado alguma similaridade. Algo que lhe chamou a atenção. Queria ser cúmplice. Lançar um olhar que só eu conseguiria ler.<br />E então você desceu na próxima estação.<br /><br />***<br /><br />Tento te explicar o que é azul.<br />Mostro o céu ( que hoje, em particular, me ajudou na exemplificação),<br />“É o azul que o colore”.<br />“O azul é azul?”<br />“É.”<br />Então você pegou o carrinho do bolso, azul. “Este também?”<br />“Também”.<br />Mais uns vinte objetos apontados aqui e ali.<br />“Também”.<br />Tapeação barata:<br />Não sei como é o azul de fora pra dentro dos seus olhos.<br /><br />***<br /><br />As mãos são instrumento de trabalho de toda gente.<br /><br />***<br />Te avistei e logo a pulsação subiu. Não saberia o que falar, como começar. Iria gaguejar.<br />Nós, tímidos um do lado do outro. Desconfortáveis. As palavras certas eram erradas se proferidas naquele instante a além. Entonação. Resposta. Quero saber o que você pensa, quero invadir. Você o mesmo, é certo. Mas não há espaço. Quanto mais perto ficamos, mais o ar se torna rarefeito e as frases ridículas. Pelo menos é um ar com significado. Muito dele. Mas, difícil de respirar para ambos.<br />Aquele estar sem graça de sempre. Eu saio e você. <br />Nunca nos entenderemos (?).<br /><br />***<br /><br />Tenho para mim que não vai além de uma piada ruim.<br />Acordei com a palavra “raiz”, na cabeça; uma fixação que vez em quando me apodera. Fixar-me numa palavra.<br />Mas daí ela vai aparecer o resto do dia.<br />Não que eu fique caçando “raiz” em qualquer letreiro por aí.<br />A palavra vem atrás de mim e sempre me alcança.s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-71903812478217570812010-07-06T18:32:00.002-03:002010-07-06T18:58:03.050-03:00Uma prosa.Não te é permitido invadir meu espaço. E, sim, é de uma circunferência particularmente grande. Não entenda mal: mesmo rodeado de pessoas até às orelhas, sufocado e esbarrando nelas, há uma imunidade que me torna surdo perante a. Então, não conseguirá invadir, furar a bolha plástica que moldei em banho maria e tormentas emocionais. <br />Pode ser que eu te escute sim, porém teria que retirar os fones de ouvido. Só então eu seria capaz de me concentrar no que quereria me dizer. Como dentro d'água: não dá pra ouvir, é abafado, disforme e sem sentido. Que diabos, pra quê falar debaixo d'água? <br />Eu sei quando vêm me falar. Não que eu "sinta", nem nada tolo assim. É o foco de quem vem, o olhar que me cutuca mesmo que eu esteja de costas; talvez um magnetismo desagradável. Assim você veio, com o foco tão nítido que talvez tropeçasse, mas não o fez. Dada a situação desagradável que viria, eu sabia, e automaticamente criei minhas listas de respostas, todas elas culminantes em negativas. Soubesse que de mim emanava tamanha repulsa, você cairia fora. Mas não.<br />Particularmente detesto conversas, geralmente elas têm um formato a ser seguido em que me sinto com três pernas, quase sempre. Há um momento em que se deve ouvir (daí fazer um olhar intrigado do "ouvinte", e o outro de resposta (que acompanha o olhar da assimilação do que foi dito). Tudo isso cansa demais os músculos do meu rosto. E é por isso que hoje em dia tenho sorrisos falsos: meus músculos faciais não aguentaram tamanho halterofilismo. <br />Sorri uma, duas vezes. Você notou meu desconforto e foi para o assunto principal, o que queria dizer de início. O que você não suspeita é minha inflexibilidade, ora, uma pessoa metódica como eu: com a mania de passar três vezes a manteiga no pão. Direita, esquerda, direita. Sempre assim, não tente mudar.<br />Leitura labial. Não te ouço, me perdi já. Talvez tenha gastado muitas palavras pra expressar algo simples. Se houvesse como, era só rebobinar a fita, tentar simplificar a gagueira.<br />Me vi acenando. Detesto que o façam, mas sempre olho dessa forma. Ridículo, você saiu com empolgação demais, como quem teria saído por cima. Mas você sabe que não. Você sabe.s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-2981537130882926582010-05-18T16:13:00.002-03:002010-06-17T08:42:10.855-03:00.Do dia infalivelmente cinza não guardou nenhuma mágoa, nem lhe atribuiu nenhuma culpa. Depressão sazonal lhe parecia algo de répteis, como ficar contente sobre a pedra e sob o sol quente. Não. O céu leitoso e denso estava mais para calma; e o vento quase frio para algo febril e aliviante (?).<br />Identificar esse estado de espírito era possível se houvesse mais palavras, neologismos, interjeições condizentes. Mas seria o único a acatar e compreender.<br />E..que raio de importância tem?<br />Fosse alegria para não ter atenção alguma.<br />Fosse tristeza para ganhar um olhar de pena, e palavra "amiga".<br />Não. E fora destes pólos bem demarcados, que importância há? Tristeza e felicidade: o que se luta contra e o que se busca. Fora desta redoma jazem os inomináveis e suas variantes.<br />Olhou para o céu que, na constante brancura avisava que demoraria para dar Sol; e que não daria chuva. De certo modo, pacífica conclusão. Basal.<br />E, dado que não era uma zona de desespero, aflitiva nem dolorosa, ficou.<br />"As pessoas <span style="font-style:italic;">melancólicas</span> devem entender bem isso".s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-18575269.post-43032490728886278662010-04-16T16:45:00.005-03:002010-04-16T17:22:02.280-03:00ConfissõesÉ a simplicidade: não consigo enxergar por esse horizonte que se descortina uma complicação sequer, ainda que seja denso. Não confundir profundidade por complicação, vejam.<br />Ouvi alguém dizer, uma vez, da leveza de seu "ser", da despreocupação, almoço, família, amigos. "Não sou aquela pessoa densa: a folha caiu 'pois' (risos)".<br />Não há leveza nenhuma no que posso dizer de meu. Há uma tonelada amorfa por sobre tudo, densa, significativa. Talvez eu "pense" porque me preocupe, mas sobretudo por ser tão inclinada a. Das fôrmas que me moldaram, notei nitidamente o tom grave desse som que norteia alguns dos meus desenhos: nanquim, sombra, quase furando o papel.<br />Não é triste, nem feliz, é suficientemente natural. Suficientemente simples.<br />Sob essa imagem carregada, com bordas bem demarcadas, a tensão da superfície guarda a gota maleável, que pode adquirir várias formas, mas sempre voltar a ser gota.<br /><br />(...)<br /><br /><br /><span style="font-weight:bold;">Confissões: </span><br />*Em prosa (pra não dizer "prosáico"), há prazer em andar ao vento e ver o cabelo voar pra trás;<br />*Pra não exagerar e dizer que ouço música 24 horas por dia: ouço por pelo menos 18 horas sem parar. É o vento citado acima que preenche o balão colorido e dança, pulsa, e tilinta;<br />*É ridículo, mas tenho surtos românticos; sobre o de cima: ainda não encontrei algo que substitua a música com sua enormidade, profundidade, misturas complicadas e - ao mesmo tempo - simples, soa, flui;<br />*Sorrio, falo, canto, penso alto, sozinha, na rua. Só não danço porque não dou pra coisa;<br />*Sou algumas pessoas distintas, aperto com mais força alguma tecla desse piano dependendo de quem for. <span style="font-style:italic;">Fool full time</span> pra minhã irmã, isso ou aquilo pra mais alguém...e assim vai. Somando tudo, sou eu;<br />*Meu momento mais narcisista é o de ouvir minha voz.s o lhttp://www.blogger.com/profile/16060336861709593143noreply@blogger.com1