22.11.11

Uma Descrição da Dor / Uma Longa Hora Depois / Acabei dormindo por cinquenta minutos na poltrona nove imaginárias; tal como anos bissextos.

Uma Descrição da Dor.

Ando sempre atrasada como se o azar colaborasse com isso. Porque quem planeja não deveria se atrasar como eu o faço. Tratam-se de sucessões de atrasos, de “não acredito que você ainda não sabia disso” , de dp’s, de estar um triz de distância de onde eu devia estar agora.
Eis que estava em tempo de pegar o ônibus, três da tarde sairia, eram duas e cinquenta e seis; tempo suficiente para os 50 metros que me restavam. Duas e cinquenta e sete o ônibus passou correndo ali na frente, no que parecia a exceção de se sair mais cedo que o motorista fez. Exceções sempre ferem uns desavisados que esperam por regra. Planejar horários e crer piamente que dá pra percorrer 50 metros em 3 minutos deixa de ser uma verdade newtoniana assim que o motorista toma a exceção de sair mais cedo.
Minhas panturrilhas queimavam depois do meu trote desajeitado: calça jeans, bolsa, calor. Agora eu podia fazer tudo sem hora pra fazer nada. Ótimo: uma hora inteira esperando o próximo ônibus na rodoviária. Vendo novela e bebendo Schweppes.

Uma Longa Hora Depois.

Sete ônibus passantes (nenhum para meu destino), um refrigerante, oito balas de goma, meia novela e um pouco de pessimismo depois; finalmente meu ônibus estacionou na plataforma. Naturalmente, me levantei e fui na direção; dando o nítido aviso de que eu merecia entrar primeiro já que havia esperado uma hora ali.
Poltrona nove. Minha propriedade temporária: poltrona nove. Ninguém me incomodaria pra sair do lugar, o que acontece muito nesses ônibus que pegam punhados de gente pelo caminho que se sentam nos lugares demarcados dos passageiros da próxima rodoviária. Enfim.
Um, dois; três, quatro; cinco, seis; sete, oito; onze, doze. O tipo de coisa que só acontece em desaniversários, decerto.

Acabei dormindo por cinquenta minutos na poltrona nove imaginárias; tal como anos bissextos.

Forcei-me a despertar, porque podia estar chegando. Engano meu, visto o trânsito. Nada de pânico à partir dali: pelo menos ninguém me tirou do meu lugar. O lugar ao meu lado, outrora vazio, foi ocupado por um senhor de meia-idade. Ao que abri os olhos, ele veio falar que estava ali porque algum passageiro malvado havia sentado no lugar dele. “É chato pegar alguém no lugar que já estava marcado, mas também é chato pedir pra sair”. Então expliquei a ele, com a sabedoria de quem toma aquele itinerário há um tempão, que a culpa era da viação por ir lotando o ônibus no caminho sem verificar as poltronas. Acho que ele entendeu.

Continua...

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