5.1.14

Consonância

Sempre quis mostrar a tristeza profunda que residia atrás de seus olhos, mas nunca tivera atenção. Então, ao invés disto, exibiu várias lâminas de felicidade. Lâminas fatiadas e finas, superficiais. Uns fragmentos que, se juntássemos, não compunham um quebra-cabeças completo.
Sabia que sempre lhe faltaria essa peça. Ou melhor, sempre sobraria aquela outra.
Vários sorrisos, mas nenhum olhar mais profundo. Muitas frases feitas e silêncios entre elas.
Tudo transcorria com tranquilidade no mundo dos serenos. Mas ninguém iria dormir um sono com sonhos tranquilos aquela noite. Nem na próxima. Um som de apito para cães, aquela vibração dentro da caixa torácica, quando o silêncio é tão esmagador. E a solidão tão cortante.
E a felicidade estava em cacos. Pedacinhos pequenos que teimavam em juntar, mesmo que isso não tivesse significado  lógico: juntava-se um lado, o outro se desfazia. Nunca satisfeitos.
E a vida passava o tempo tentando casar o que não precisava, de olhos fechados, desatenta.