10.12.10

Transcendente.




Estava assistindo a um documentário sobre pessoas que fazem documentários sobre documentários e se aborreceu.
Não que tivesse alguma objeção à rotatividade cotidiana e a desenfreada vida agitada que estava acostumado a levar. Não. Se parasse, o que restava era.
Mas, devia haver um momento em que a recompensa, a luz brilhante brilharia em sua cara. Devia haver, para que o Universo não entrasse num colapso por balanço de massa mal feito, em excesso de porcarias e pessimismo. Deve haver, pensou alto, há de ter uma razão pra esta corrida contra o tempo.
Pensou de forma pejorativa sobre convertidos e beatos e todo o tipo de crentes; crentes crendo na recompensa, na luz, seguindo regras pra ter um pedaço do céu, comprando lascas falsificadas da cruz pra que tivessem alma.
Invejou quem tinha alma. Invejou todos que tinham crenças. Quis ser todos os fiéis e seus dízimos, toda a forma de paz, consolo e conformismo. Quis entoar um mantra, mas não soube como começar.
O ambiente cheirava à sabonete e cigarros. Música ligada, filete de fumaça. Nada mais, nenhum santo ou qualquer vida sobrenatural. Nada além do concreto, físico o suficiente para deprimí-lo, pra botar mais medo. Vou pintar a parede de verde, pensou alto mais uma vez, num átimo de segundo.
Notadamente não era tarde demais: não há tempo fora do relógio e, quando olhou para o que estava afixado na parede monocromática, viu que nem um minuto havia passado.
Droga.
E acendeu outro cigarro, e a música se potencializou. Todos precisam de trilha sonora.
Ansiedade já foi se dissipando. Voltou ao documentário ao som de música. Não precisava entender nenhum dos dois, mas deviam estar ligados ao mesmo tempo.
Um dia, dois dias, três dias, uma hora. O cigarro tinha fim e logo acendia outro.
E quando acabou o documentário, apagou a TV; desligou a música. Tudo escuro e teve medo.

7.10.10

Descrição qualquer.

O trajeto é simples: tranco a porta e automaticamente atravesso a rua, salpicando os sapatos de cascalho que jogaram sobre as pedras. E então, quando lá estou no outro passeio, o que tem motivos que me remetem a qualquer calçadão praiano, ouço o som de quando andava por algum parque de chão forrado de pedrinhas. É inevitável pensar isso, mesmo que não me remeta a algum sentimentalismo em relação à cena. Mesmo que apenas haja uma conexão por comparação direta, algo próprio do meu cérebro em particular.
Ao que já está ligado ao cerebelo, não preciso pensar no trajeto, já feito tantas vezes que talvez até os passos sejam contados sem que eu tenha consciência de sua exatidão. Virar a esquina que já está próxima só é percebido quando a rajada de vento, aprisionada nas perpendicularidades das esquinas, se apodera dos meus cabelos jogando-os para trás. Continuo os passos, agora sem o som das pedrinhas; o que me permite perceber os carros, se passam; as pessoas em torno, se cruzam; o ar em geral da rua em movimento. Acato tudo caminhando, nada me acrescenta. Chego ao destino que é logo ali, tão próximo de casa.
Uma porção de informações, aquarelas para meus olhos, tantas construções que até o chão que eu piso fora forjado.
E nada disso tem importância, nem pra mim, nem pra nenhum outro por aqui.
Deve ser algum tipo de defesa.

27.7.10

Três

Se ando pela rua, é sempre tentando acertar meus passos. É inevitável pensar que os outros que andam comigo, ou em minha direção têm rumo definido e passos firmes.
Sou um(a) sonhador(a), e flutuo acima dos meus pés e das minhas expectativas. Com um sentimento nítido de que não sou daqui, permaneço de onde saí. Mesmo não sabendo que lugar é. Um tipo de inércia sem corpo; tipo uma marca de nascença que não se pode ver.
Das grandes indagações que ousei pensar, a que mais pesa é a necessidade de estar sempre indagando sem obter uma explicação, uma boa explicação.
Mais fácil seria se a vida passasse sem a gravidade dessa grande dúvida.
Mas sem a gravidade, não seria atingida a profundidade desejada.

****


Estou olhando para fora e, mesmo que não quisesse, posso sentir o cheiro da chuva. A chegada dela me arrepia a pele e faz balançar as árvores.
Ouvi de cinco pessoas diferentes, cinco relatos totalmente inesperados do que possa ser a chegada da chuva.
Perguntaram, na minha vez, qual meu olhar sobre tudo. Dei a entender que o cinzento que tomava o céu não só era amedrontador, como uma força impossível de se deter (sempre incapaz de me expressar verbalmente). Perguntaram-me, então, se a vinda da chuva me fazia mal. "Não. Sobretudo me faz bem. Forças assim que me fazem parar". Não sei o que poderia me deter não fosse uma chuva vindo. Teria que alçar voo noutro momento.

****

É a visão de quem tudo vê! A cabeça de quem tudo pensa! O impossível de quem tudo pode fazer.
Ideal bobo e desnecessário(?).

14.7.10

Fragmentado.

***

Dentro do metrô é praticamente noite. As vezes em que a máquina passa por trechos descobertos não contam: no metrô só se faz noite, e as luzes sempre estão acesas. Isso dá motivo para aquela lâmpada piscar estrategicamente, conferindo uma aura que eu conheço bem.
Bando de répteis. Isso de “sangue-frio” vai além de um comportamento macabro ou estômago forte demais. Um bando de répteis com rostos cinzas, olhando pro nada, olhando para ninguém. Não se encaram, desviam olhares. Confissão de culpa. É o ar doentio do metrô, do subsolo; como uma pedra quente e um lagarto.
Seguram-se, guiados pela inércia; mecanimanente entram e saem.
Então você disse de súbito (me assustei) que pra quebrar o transe, nem um balde de água fria. Como se lesse meus pensamentos. E lia sim. Éramos dois dos zumbis com consciência.
Estava claro porque não respondi logo; porque não respondi hora alguma. “Tenho certeza que nos conhecemos”, aquela velha sentença. Que lembrava vagamente. Que meu rosto era familiar. Que tinha que.
As pessoas são muito iguais, mesmas fôrmas. Rostos similares passeiam por aí simultaneamente. Criatividade alguma, limitação. Sobretudo ali; ali são cinzas. Todos os gatos são pardos.
Podia ser que já tivéssemos nos cruzado pelas ruas, cada qual fitando o chão. Natural. Você sorria, havia descoberto um continente. Ou melhor, havia notado alguma similaridade. Algo que lhe chamou a atenção. Queria ser cúmplice. Lançar um olhar que só eu conseguiria ler.
E então você desceu na próxima estação.

***

Tento te explicar o que é azul.
Mostro o céu ( que hoje, em particular, me ajudou na exemplificação),
“É o azul que o colore”.
“O azul é azul?”
“É.”
Então você pegou o carrinho do bolso, azul. “Este também?”
“Também”.
Mais uns vinte objetos apontados aqui e ali.
“Também”.
Tapeação barata:
Não sei como é o azul de fora pra dentro dos seus olhos.

***

As mãos são instrumento de trabalho de toda gente.

***
Te avistei e logo a pulsação subiu. Não saberia o que falar, como começar. Iria gaguejar.
Nós, tímidos um do lado do outro. Desconfortáveis. As palavras certas eram erradas se proferidas naquele instante a além. Entonação. Resposta. Quero saber o que você pensa, quero invadir. Você o mesmo, é certo. Mas não há espaço. Quanto mais perto ficamos, mais o ar se torna rarefeito e as frases ridículas. Pelo menos é um ar com significado. Muito dele. Mas, difícil de respirar para ambos.
Aquele estar sem graça de sempre. Eu saio e você.
Nunca nos entenderemos (?).

***

Tenho para mim que não vai além de uma piada ruim.
Acordei com a palavra “raiz”, na cabeça; uma fixação que vez em quando me apodera. Fixar-me numa palavra.
Mas daí ela vai aparecer o resto do dia.
Não que eu fique caçando “raiz” em qualquer letreiro por aí.
A palavra vem atrás de mim e sempre me alcança.

6.7.10

Uma prosa.

Não te é permitido invadir meu espaço. E, sim, é de uma circunferência particularmente grande. Não entenda mal: mesmo rodeado de pessoas até às orelhas, sufocado e esbarrando nelas, há uma imunidade que me torna surdo perante a. Então, não conseguirá invadir, furar a bolha plástica que moldei em banho maria e tormentas emocionais.
Pode ser que eu te escute sim, porém teria que retirar os fones de ouvido. Só então eu seria capaz de me concentrar no que quereria me dizer. Como dentro d'água: não dá pra ouvir, é abafado, disforme e sem sentido. Que diabos, pra quê falar debaixo d'água?
Eu sei quando vêm me falar. Não que eu "sinta", nem nada tolo assim. É o foco de quem vem, o olhar que me cutuca mesmo que eu esteja de costas; talvez um magnetismo desagradável. Assim você veio, com o foco tão nítido que talvez tropeçasse, mas não o fez. Dada a situação desagradável que viria, eu sabia, e automaticamente criei minhas listas de respostas, todas elas culminantes em negativas. Soubesse que de mim emanava tamanha repulsa, você cairia fora. Mas não.
Particularmente detesto conversas, geralmente elas têm um formato a ser seguido em que me sinto com três pernas, quase sempre. Há um momento em que se deve ouvir (daí fazer um olhar intrigado do "ouvinte", e o outro de resposta (que acompanha o olhar da assimilação do que foi dito). Tudo isso cansa demais os músculos do meu rosto. E é por isso que hoje em dia tenho sorrisos falsos: meus músculos faciais não aguentaram tamanho halterofilismo.
Sorri uma, duas vezes. Você notou meu desconforto e foi para o assunto principal, o que queria dizer de início. O que você não suspeita é minha inflexibilidade, ora, uma pessoa metódica como eu: com a mania de passar três vezes a manteiga no pão. Direita, esquerda, direita. Sempre assim, não tente mudar.
Leitura labial. Não te ouço, me perdi já. Talvez tenha gastado muitas palavras pra expressar algo simples. Se houvesse como, era só rebobinar a fita, tentar simplificar a gagueira.
Me vi acenando. Detesto que o façam, mas sempre olho dessa forma. Ridículo, você saiu com empolgação demais, como quem teria saído por cima. Mas você sabe que não. Você sabe.

18.5.10

.

Do dia infalivelmente cinza não guardou nenhuma mágoa, nem lhe atribuiu nenhuma culpa. Depressão sazonal lhe parecia algo de répteis, como ficar contente sobre a pedra e sob o sol quente. Não. O céu leitoso e denso estava mais para calma; e o vento quase frio para algo febril e aliviante (?).
Identificar esse estado de espírito era possível se houvesse mais palavras, neologismos, interjeições condizentes. Mas seria o único a acatar e compreender.
E..que raio de importância tem?
Fosse alegria para não ter atenção alguma.
Fosse tristeza para ganhar um olhar de pena, e palavra "amiga".
Não. E fora destes pólos bem demarcados, que importância há? Tristeza e felicidade: o que se luta contra e o que se busca. Fora desta redoma jazem os inomináveis e suas variantes.
Olhou para o céu que, na constante brancura avisava que demoraria para dar Sol; e que não daria chuva. De certo modo, pacífica conclusão. Basal.
E, dado que não era uma zona de desespero, aflitiva nem dolorosa, ficou.
"As pessoas melancólicas devem entender bem isso".

16.4.10

Confissões

É a simplicidade: não consigo enxergar por esse horizonte que se descortina uma complicação sequer, ainda que seja denso. Não confundir profundidade por complicação, vejam.
Ouvi alguém dizer, uma vez, da leveza de seu "ser", da despreocupação, almoço, família, amigos. "Não sou aquela pessoa densa: a folha caiu 'pois' (risos)".
Não há leveza nenhuma no que posso dizer de meu. Há uma tonelada amorfa por sobre tudo, densa, significativa. Talvez eu "pense" porque me preocupe, mas sobretudo por ser tão inclinada a. Das fôrmas que me moldaram, notei nitidamente o tom grave desse som que norteia alguns dos meus desenhos: nanquim, sombra, quase furando o papel.
Não é triste, nem feliz, é suficientemente natural. Suficientemente simples.
Sob essa imagem carregada, com bordas bem demarcadas, a tensão da superfície guarda a gota maleável, que pode adquirir várias formas, mas sempre voltar a ser gota.

(...)


Confissões:
*Em prosa (pra não dizer "prosáico"), há prazer em andar ao vento e ver o cabelo voar pra trás;
*Pra não exagerar e dizer que ouço música 24 horas por dia: ouço por pelo menos 18 horas sem parar. É o vento citado acima que preenche o balão colorido e dança, pulsa, e tilinta;
*É ridículo, mas tenho surtos românticos; sobre o de cima: ainda não encontrei algo que substitua a música com sua enormidade, profundidade, misturas complicadas e - ao mesmo tempo - simples, soa, flui;
*Sorrio, falo, canto, penso alto, sozinha, na rua. Só não danço porque não dou pra coisa;
*Sou algumas pessoas distintas, aperto com mais força alguma tecla desse piano dependendo de quem for. Fool full time pra minhã irmã, isso ou aquilo pra mais alguém...e assim vai. Somando tudo, sou eu;
*Meu momento mais narcisista é o de ouvir minha voz.

25.3.10

À disposição!

O bom é que sempre encontraremos pessoas dispostas a nos dar um conselho. A cantar uma lição de moral ou lançar um olhar sábio e calejado.
É fato (?): Todos são tão experientes, todos estão tão à frente (vanguardistas!)que é inaceitável negar uma gota sequer de sua sabedoria.
(...)
As pessoas são tagarelas, mas alguns tópicos prevalecem. Um deles é este. São tão bonachões e especialistas em tudo que posso me dizer constrangida.
Caramba, falar de "gente" é tão complicado...por que nos fazemos assim?
Vá em frente! fuja e não tenha horário! Erre e sacaneie uma vez na vida pra variar; sinta o gosto da culpa e/ou remorso pelo menos uma vez...Mas faça tudo isso conscientemente; porque ao contrário disto, muitos já o fazem (mas jurando de pé junto que não - e distribuindo conselhos como se fosse um santo ¬¬). É fácil ser hipócrita consigo mesmo.
Quebre suas próprias regras (clichê baixo, porém necessário), que talvez você vá se descobrir de uma forma inesperada.






.

11.3.10

Namorado imaginário.

À parte todas as piadinhas referentes à casamento e relacionamentos estáveis, essa banalização ao amor está indo longe demais.
Não se entregue, não sonhe, não seja demasiadamente piegas e babão. Há, claro, um quê de ridículo em extremar o "Amor", seja à ponto de torná-lo demodê; ou então desfazendo-o por completo! Cultue o prazer, a carne e o orgasmo. Sejamos hedonistas, pois a adrenalina envolvida vale o esforço.
Não se conhece mais ninguém. Não se confia, não se quer mais nada. Adentrando-se cada vez mais nesta frieza, podemos nos ver em meio a estranhos, lançando olhares lascivos a terceiros.
Quem se julga amante, "quem ama", é o típico sujeitinho(a) com um namoro de costume, que vai sentir-se culpado(a) a cada vontade que surgir: de liberdade, de um amor de verdade, de poder fechar os olhos e sorrir (sorry, "Os Pullovers"! Pequena citação de sua música).
Fechar os olhos e sorrir...
Mas para qual figura? Quem causa seu sorriso? Teu equilíbrio e tua paz? Difícil hoje em dia... Por mais gente que se possa avistar: bonita, jovem, fértil (wow!), não há ninguém!
E então?
...

2.3.10

18.2.10

Vibe

Estava abundante de gente, abafado, escuro, úmido, pulsante. Entre suor e ritmo, ia conforme lhe convinha; conforme parecia natural fazer.
Numa onda ritmada e compacta todos iam, conforme as marionetes ordenavam, gritavam. Conforme parecia natural fazer.
como em flashes, que logo seriam apagados da memória; sem deixar vestígios. Um gosto metálico, moderno. Engrenagem.
Felicidade, sim: felicidade. Que outra coisa podia-se exprimir? Sensação de poder.
Em espiral, rotatividades confusas, um roda de possibilidades. Sensualidade demasiada.


(...)


Apatia, frustração e culpa. Tudo volta a ser cinza quando se acende a luz.

Música & Entorpecentes

Andamos musificando tudo por aí, inventando estilos - que são vários; já se sabe. A justificativa mais comum é a necessidade de se expressar, seja através de uma composição, seja pelo movimento corporal, ou através do "outfit".
...
Sob um olhar incógnito, à parte as baboseiras cerebrais, sinapses e etc, a música é viciante. Não só isso e não tão simplista assim. (...)
Que tipo de reação é essa que faz o corpo pulsar conforme o som? Alguma espécie de hipnose? E os sentimentos que determinada música pode causar a uma pessoa?
Não se sabe por que musificamos, como e por que cantamos e dançamos. Soa natural, animalesco.
Até a voz muda quando cantamos.
É um pouco bizarro pensar, porque não faz sentido nenhum. Ao mesmo tempo, a vida seria muito, muito vazia sem ela.
Muito mais que expressão cultural, expressão de sentimentos. Visceralmente falando, se a alma existe, ela pulsa com a música. É, certamente, outro mistério da humanidade. Pouco levada à sério, é verdade. Mas, como seria a vida humana sem música?

"O vaso dá uma forma ao vazio e a música ao silêncio." (Georges Braque)

13.2.10

Das duas, uma:

Já não assisto TV. Resolvi ver pelo menos o noticiário, ou melhor, o noticiário menos parcial.
Que só passa desgraça e estraçalhamento, todos já sabemos.
Das duas, uma (ou mais):criar compaixão? Tornar-nos frios?
Vai saber.

12.2.10

De fato,

para o primeiro post do ano, nada mais adequado que começar quase depois do carnaval.Por um pouco quase o fiz; o que estaria de acordo com o Calendário Brasileiro.
A negligência total dedicada a esse fuckin' blog se dá ao motivo óbvio de eu digitar para às paredes digitais: ninguém vai ler. Pois é.

Vale comentar que mudei o nome do blog. Fucking Blog! Ando escrevendo em inglês pra caramba...Estou esquecendo de como é articular-se em português.
Outra mudança foi o do template, para um "clean".
Creio que as mudanças se devam ao fato de eu sempre procurar por resoluções de começo de ano. Bullshit! No fim das contas, a gente empurra com a barriga à partir de abril.

Okay, vale o juramento de estudar durante o semestre, manter o blog atualizado para os ilustríssimos leitores e jamais....hm, enough.