Sinaliza uma circunferência com o
dedo indicador.
- Mas eu sei de uma melhor - “Eu”
com ênfase demasiada – ou pior, como quiserem.
Ajeitou-se na cadeira na postura
de um cúmplice.
- Minha prima – pausa para olhar
para a cara de todos. Dentre desinteressados e acenos com a cabeça, continuou –
vocês não a conhecem, ela não mora na cidade. Não sei como ela suporta essa
vida, coitada. Ela arranjou esse namorado há um ano e meio, eles se conheceram em
um espaço para fumantes numa balada, não lembro qual.
O garçom voltava com a outra
cerveja que ela pedira.
- Obrigada. Pois bem, marcaram de
ser encontrar mais uma vez. E outra... E outra. E então meio que já estavam
namorando. Ela foi um pouco tola, claro. Quando percebeu, já estavam muito
grudados, interferindo em tudo na vida um do outro. Ele era muito ciumento.
Muito. Quase perdeu todos os amigos, porque foi se afastando, recusando
convites... Enfim.
Quis terminar com tudo aquilo há
uns oito meses atrás, ela estava realmente sobrecarregada, sem vida social
nenhuma – bebericou a cerveja e seus dedos ficaram gelados por causa do copo –
E claro, ele chorou, se recusou em perdê-la. Duvidou da fidelidade dela e a
ameaçou. Ela não levou aquilo à sério, ela não estava o traindo. Só estava
querendo respirar de novo. Ele disse que ela não arranjaria mais ninguém, que
não ficaria com mais ninguém, etc, etc. Ela não tomou nada daquilo como
verdade. Ele estava nervoso, tudo melhoraria com o tempo. Estavam fazendo mal
um ao outro.
Passou-se um mês, e não se
falaram nesse tempo. Mas às vezes o telefone dela tocava às 2 da manhã e ficava
mudo do outro lado – riu um riso nervoso – marcou um cinema com um amigo uma
vez, e mais uma vez seu telefone tocou numa madrugada qualquer. Ele disse que
estava vigiando, que ela tomasse cuidado. Não sei em que dimensão que isso
ficou, mas ela resolveu se mudar daqui, foi para Curitiba. Lá, achou que
recomeçaria tranquila, mas, depois de um tempo ele havia descoberto. Acordou e,
ao seu lado na cama, havia um revólver. Minha prima ficou transtornada,
resolveu mudar-se mais uma vez. Dessa vez para Cuiabá.
Suspirou.
- Há um tempo não falo com ela.
Não sei como reagiria numa situação dessas. Claro, já tive um episódio
estranho, mas não como este!
Agora tinha mais atenção do que
no início da história.
-Estava voltando de Sorocaba de
ônibus, era meio-dia, ou uma hora. Não lembro. Então chegou uma sms no celular.
Dizia “oi, tudo bem? Para quem escrevo?” ou algo assim. Era de um número fora
da minha lista de contatos, ali da região mesmo. Perguntou se eu era homem ou
mulher. Daí descobri que era homem. Conversamos muito; perguntou como eram meus
cabelos. Fui me acostumando com a cadência da conversa, esperando as sms. Achei
aquilo uma aventura interessante. O que fazia da vida, se trabalhava, o que
gostava de fazer nas horas vagas, qual tipo de música ouvia. No fim, uma
pergunta ficou no ar... Ele não respondeu mais. Fiquei esperando mais um tempo,
mas resolvi não mandar mais nenhuma. Sequer soube o nome dele. Nem ele o meu. Às
vezes penso sobre aquele dia. É engraçado como duas pessoas tem formas tão
diversas de se encontrar. E ao mesmo tempo isso é tão perigoso.
Riu reticente, olhando para algum
ponto no infinito. As pessoas conversavam, respondiam. Sua atenção foi para o
espaço. Algo emoliente havia batido contra seu peito, agora tudo estava meio
aquoso, suave.
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