28.4.13

Cigarros imaginários


Sinaliza uma circunferência com o dedo indicador.
- Mas eu sei de uma melhor - “Eu” com ênfase demasiada – ou pior, como quiserem.
Ajeitou-se na cadeira na postura de um cúmplice.
- Minha prima – pausa para olhar para a cara de todos. Dentre desinteressados e acenos com a cabeça, continuou – vocês não a conhecem, ela não mora na cidade. Não sei como ela suporta essa vida, coitada. Ela arranjou esse namorado há um ano e meio, eles se conheceram em um espaço para fumantes numa balada, não lembro qual.
O garçom voltava com a outra cerveja que ela pedira.
- Obrigada. Pois bem, marcaram de ser encontrar mais uma vez. E outra... E outra. E então meio que já estavam namorando. Ela foi um pouco tola, claro. Quando percebeu, já estavam muito grudados, interferindo em tudo na vida um do outro. Ele era muito ciumento. Muito. Quase perdeu todos os amigos, porque foi se afastando, recusando convites... Enfim.
Quis terminar com tudo aquilo há uns oito meses atrás, ela estava realmente sobrecarregada, sem vida social nenhuma – bebericou a cerveja e seus dedos ficaram gelados por causa do copo – E claro, ele chorou, se recusou em perdê-la. Duvidou da fidelidade dela e a ameaçou. Ela não levou aquilo à sério, ela não estava o traindo. Só estava querendo respirar de novo. Ele disse que ela não arranjaria mais ninguém, que não ficaria com mais ninguém, etc, etc. Ela não tomou nada daquilo como verdade. Ele estava nervoso, tudo melhoraria com o tempo. Estavam fazendo mal um ao outro.
Passou-se um mês, e não se falaram nesse tempo. Mas às vezes o telefone dela tocava às 2 da manhã e ficava mudo do outro lado – riu um riso nervoso – marcou um cinema com um amigo uma vez, e mais uma vez seu telefone tocou numa madrugada qualquer. Ele disse que estava vigiando, que ela tomasse cuidado. Não sei em que dimensão que isso ficou, mas ela resolveu se mudar daqui, foi para Curitiba. Lá, achou que recomeçaria tranquila, mas, depois de um tempo ele havia descoberto. Acordou e, ao seu lado na cama, havia um revólver. Minha prima ficou transtornada, resolveu mudar-se mais uma vez. Dessa vez para Cuiabá.
Suspirou.
- Há um tempo não falo com ela. Não sei como reagiria numa situação dessas. Claro, já tive um episódio estranho, mas não como este!
Agora tinha mais atenção do que no início da história.
-Estava voltando de Sorocaba de ônibus, era meio-dia, ou uma hora. Não lembro. Então chegou uma sms no celular. Dizia “oi, tudo bem? Para quem escrevo?” ou algo assim. Era de um número fora da minha lista de contatos, ali da região mesmo. Perguntou se eu era homem ou mulher. Daí descobri que era homem. Conversamos muito; perguntou como eram meus cabelos. Fui me acostumando com a cadência da conversa, esperando as sms. Achei aquilo uma aventura interessante. O que fazia da vida, se trabalhava, o que gostava de fazer nas horas vagas, qual tipo de música ouvia. No fim, uma pergunta ficou no ar... Ele não respondeu mais. Fiquei esperando mais um tempo, mas resolvi não mandar mais nenhuma. Sequer soube o nome dele. Nem ele o meu. Às vezes penso sobre aquele dia. É engraçado como duas pessoas tem formas tão diversas de se encontrar. E ao mesmo tempo isso é tão perigoso.
Riu reticente, olhando para algum ponto no infinito. As pessoas conversavam, respondiam. Sua atenção foi para o espaço. Algo emoliente havia batido contra seu peito, agora tudo estava meio aquoso, suave.


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